O ser humano,
antes de qualquer coisa, é um ser pensante, por isso ele cria, de
tal modo que podemos criar as mais diversas histórias, verossímeis
ou surreais, mas que sempre nos acompanham ao longo de nossas vidas
porque o discurso estético contagia e influencia pessoas, temos
necessidade de ficção e, sabendo disso, o homem usa a ficção
conforme seus interesses.
Recorrer ao discurso
literário se afirma por nossa necessidade de fantasia. Porém, a
vida do bicho homem gira em torno de interesses, é aí que mora o
perigo, onde desviam o papel da literatura como arte por sua
finalidade em si mesma para distorcer conceitos, discursos e valores
morais/sociais para doutrinar pessoas, bem como lucrar com isso.
Recorre-se tanto a literatura
para a doutrinação por causa do que chamamos de verossimilhança
com o real, bem como a descrição de palavras singelas que, por sua
vez, emociona e transmite uma noção de verdade, a ponto de
acreditarmos que tudo que está ali de fato aconteceu, pois
confundimos a verdade do texto literário (sobre os fatos narrados na
estória) com a verdade do mundo real (do dia a dia). Certo momento,
ficção e realidade se fundem e confundem, tal confusão nos faz
imaginar que seres imaginários possam de fato existir e assombrar
nosso cotidiano, pois os fatos descritos pelo narrador/personagem são
tão convincentes que chegam a nos fazer acreditar que lobisomem,
fantasmas, deuses imaginários, etc., podem habitar e nos vigiar no
plano real, pelo simples fato de a ficção ser assim, porque quem
conta a estória, o narrador/personagem, se afirma numa testemunha
ocular de que aquilo de fato aconteceu.
Uma das verdades disso tudo
é que o fato de sermos, na maioria das vezes, ledores e não
leitores, bem como preguiçosos para estudar teoria da narrativa e
outras linhas de pesquisa permite que continuemos a persistir no
erro, uma vez que o pior cego é aquele que não quer ver. A cegueira
é algo que contagia, que pega de uma pessoa pra outra, que por isso
ela pode ser financeiramente rentável, pessoas cegas agem na ilusão,
sem usar a razão, a cegueira aprisiona pessoas, faz elas construírem
muralhas e barreiras que as impedem de dialogar com o mundo.
Na ficção tudo é
possível, ela agrada até o mais leigo dos leitores, nos entregamos
à ficção porque nos encantamos com ela, mas como? É tão parecido
com o real que chega a confundir, não sei, como pode isso? Vamos
entender, o ser humano tem sentidos, ele fala, chora, sorri, sofre,
batalha, é traidor, etc., o texto ficcional nos dá a impressão de
realidade justamente pelos personagens serem parecidos com a raça
humana, onde o papagaio pode pensar e falar, a zebra cantar e dançar,
etc, tudo é possível no mundo ficcional, é só deixar a imaginação
fluir. Não acredita? Sente, escreva e crie seus próprios
personagens, atribua-os características humanas para arrancar
sorrisos e lágrimas do seu leitor, assim as obras de arte são
criadas. Uma paisagem sem personagens falantes pouco atrairia nossa
atenção, seria como uma paisagem morta, é preciso dar vida ao
sonho, atribuir aos personagens a capacidade de falar, se comunicar,
pensar, emocionar, etc., por isso nos atrai tanto.
No texto ficcional o autor, disfarçado de narrador/personagem,
chega a ser tão persuasivo a ponto de nos fazer acreditar que aquilo
que está na obra de fato aconteceu, acabamos por nos envolver e se
entregar aos encantos das palavras ali contidas, pois pregam noções
do bem falar e do bem viver. É aí que mora o perigo, pois as
pessoas agem conforme seus próprios interesses e, assim como pessoas
nos dizem coisas tendenciosas no dia a dia, elas também escrevem,
chegando a favorecer mais um determinado grupo que a outro como, por
exemplo, mais ao homem que à mulher.
Deveriam ser impostos
limites, mas o fato é que a literatura faz com que tudo se torne
possível, momento este que o bicho homem se aproveita para agir em
detrimento de sua necessidade de poder, pregando o ódio contra o
diferente, alimentando o preconceito contra todos que não aceitem
tal ideologia, como se fossem bichos animalizados que precisam ser
adestrados. E assim o perigo em se pregar tais ideologias reina no
mundo real, onde uns caçam/gritam/discriminam aos outros, se
separando como água e óleo. Enquanto uns brigam, outros ganham
$$$$$$, de maneira que a caneta sempre está a ser usada, se
afirmando enquanto arma de guerra para assinar e fundamentar leis que
protege uns e extermina outros.
Nada é por acaso, nem mesmo
a difusão e propagação de certas ideologias, o capitalismo gira em
torno do lucro, a possibilidade de se ganhar dinheiro fácil alimenta
o ego de quem quer sempre mais e mais, porque quanto mais melhor, há
os que controlam e os que são controlados, de modo que a cegueira
faz o homem servir aos interesses do controlador.
Descobriu-se que o bicho
homem pode mobilizar exércitos, por isso se manipula tanto, para
fazer o rebanho trabalhar em prol de interesses de uma minoria, e
isso é lucrativo, há ideologias que movimentam milhões no setor
industrial, disseminá-las chega a ser tão importante, quer dizer,
lucrativo, satisfaz o ego de quem ganha, pois enquanto uns rezam
outros lucram $$$$$$, ah, o lucro $$$$$$, compra pessoas, objetos,
casas, mansões, indústrias, etc., disseminar determinadas
ideologias é lucrativo para avantajar os que se dizem mais espertos,
o ideal seria que cada um trabalhasse para sua própria
sobrevivência, mas quando se faz um batalhão trabalhar para
sustentar uma minoria é mais vantajoso, pelo menos para a minoria
que faz usufruto desses lucros produzidos pela maioria.
É nesse momento que a cobra
ganha asas, onde os discursos tendenciosos ganham asas, favorecendo
mais a uns que a outros, onde o conceito de moral, ética, justiça,
etc., disfarçados de igualdade social e racial, se afirmam enquanto
desiguais, pois se a doutrinação separa as pessoas não há
igualdade, há diferenças na forma de se ver, enxergar e tratar as
pessoas. O bicho homem cria motivos para tudo, até para guerrear,
para fazer uns matarem aos outros, como bichos caçadores que querem
dizimar os demais de sua própria espécie, espalhando o ódio entre
eles, cegando-os a ponto de eles não enxergarem que estão sendo
usados, e eles continuam a ser usados porque não enxergam, não
querem ver. Para que uns ganhem outros precisam perder $$$$$, uns
perdem e outros ganham, ganham, ganham tanto $$$$$ como também
perdem.
A possibilidade de ganhos
alimenta a indústria, a literatura alimenta seres pensantes, seres
pensantes alimentam a indústria, eis o ciclo, alimentar, quer dizer,
alienar cabeças para fazê-las trabalhar em prol do sistema e/ou de
projetos de poder, é onde entra a doutrinação ideológica, onde os
discursos que ganharam asas na unha de sujeitos tendenciosos viram
possibilidades de lucros, o lucro agrada o sistema, por isso se
difunde tanto certas ideologias, pois pessoas cegas não conseguem
ver nem mesmo o mais óbvio, já que a cegueira coletiva pode ser de
interesse ao sistema e/ou pelo menos para alguns que transformam isso
em lucro para alimentar a indústria que, por sua vez, não pode
parar, os lucros precisam circular, e assim os lucros $$$$$ circulam
onde o povo não quer enxergar.
Determinados discursos doutrinadores são produzidos por pessoas que agem de má fé, de modo
que muito do que se produz é com o intuito de doutrinar pessoas, o
que justifica a pregação de uma moralidade falsa, excludente,
intimidadora, que mais cega que faz ver. O risco está no fato de
falsos valores morais fundamentarem leis e normas sociais. Eis o
perigo, deturpa-se tanto certos discursos para se empreender planos
de dominação, impondo ideologias que mais castiga que salva o povo.
O pior, nos impõem tais ideologias goela à baixo para que as
aceitemos, sem mesmo com o direito de reclamar, de modo que muitos
que resistem a tais imposições acabam por ser discriminados,
excluídos, perseguidos e/ou até mortos. É a barbárie contra a
humanidade legalizada, tudo conforme as leis dos homens, pois são
eles que criam e modificam as leis, por isso nada mais prático que
fundamentá-las e disseminá-las mais em prol de projetos de poder
que à favor do bem comum. Tentamos lutar contra isso, mas somos
somente células dentro deste vasto mundo, células são facilmente
exterminadas, somos facilmente exterminados em razão de grandes
projetos de poder, pois quem controla é quem comanda. E o silêncio
paira porque temos o hábito de fechar os olhos para o sofrimento
alheio, de maneira que pessoas costumam mais se divertir que sofrer
com a desgraça do outro, não é à toa que a indústria do cinema,
bem como de grandes obras de arte se mantêm graças à tragédia do
personagem que sofre e padece em vida, pois este nada mais é que o
retrato de nós mesmos, pois sofremos e padecemos ainda em vida, com
desgraças e tragédias que assolam nossos caminhos. O que nutre a
literatura nada mais é que o cotidiano, onde diferentes pessoas,
situadas em espaço-tempo diferentes, manifestam na arte sua forma de
ver e enxergar o mundo.
É possível
fundamentar e criar leis com base em textos, bem como em obras já produzidas, tais leis refletem bastante o interesse dessa minoria que
detém o poder da caneta para tirar e acrescentar normas e regras
sociais, de modo que se o povo não estuda nem se interessa pelo
assunto ele, automaticamente, transfere esse poder a outros, o que
não deixa de ser um risco para o bem ou o mau da sociedade. O homem
é ambicioso, quer administrar a vida de outros homens, por isso se
ele não cria, ele copia, a fim de difundir a ideologia que o
interessa, e ele não dá ponto sem nó, se disfarçam de bons, usam
de nossa boa fé para atingir seus objetivos, por mais maquiavélicos
que sejam.
O autor se afirma
por sua capacidade de convencimento, de modo que na obra de arte ele
lança mão de uma série de artifícios da linguagem para enfeitar o
seu discurso, o tom da palavra varia entre o ameno e o intenso, o
claro e o escuro, o colorido e a ausência de cores, de modo que
alegra e enfeita as personagens. Assim como diverte, também nos faz
sentir medo, frustração, angústia, revolta, etc., na ficção
temos o encontro do bom e do mau, da força celeste e da força das
trevas, é um jogo que seduz, aprisiona e liberta. Independentemente
de ser bom ou mau determinado texto, o importante é ir de encontro a
outras narrativas. Literatura educa, mas o amadurecimento do leitor
só é possível quando ele vai de encontro a outros textos para
confrontar opiniões.
A caneta é o
pincel e o papel é como a tela onde se pinta e desenha coisas boas e
ruins, de modo que o produto final varia conforme os interesses do
autor. Porém, neste vasto campo, discursos e imagens se formam e
transformam, bem como se suprime e deforma. Sejamos realistas, não
há esforço sem interesse, as pessoas agem conforme seus próprios
interesses, sejam eles particulares e/ou de grupo. Muitos se
aproximam de nós por simplesmente gostarem de nós, já outros por
interesses não revelados ou segundas intenções, é preciso malícia
ao lidar com o outro, assim eles são, assim há de ser.
Necessitamos da
ficção porque o mundo real é suficientemente chato, desbravar o
desconhecido aguça nossa curiosidade e sentidos, nos proporciona
prazer, a literatura ensina, educa e ainda é a chave para o outro
mundo, de modo que entramos e saímos deste universo com tal
naturalidade quanto o abrir e fechar uma obra de arte. A ficção é
bastante usada para se propagar diversas ideologias porque ela
contagia desde a criança até os mais velhos, pessoas querem crer e
acreditar em alguma coisa, é aí que mora o perigo, tomar o
inverídico como verdade pode nos gerar confusões e julgamentos
perturbadores, a ponto de isso influenciar nossas relações sociais,
bem como em julgamentos que mais nos separa que une. É preciso
cuidado com determinadas ideologias que adentram nossas casas, se
elas o permitem desde discriminar até cometer atos bárbaros contra
outras pessoas, inclusive contra os de sua própria família, há
algo muito errado nisso, ou com a ideologia que tu segues ou com tu
mesmo. Como tomas para si uma ideologia que o permite causar
sofrimento ao outro sem ao menos isso lhe fazer sentir nenhum
remorso? Ora, há algo errado ou com as ideologias disseminadas ou
com as pessoas.
Não acredites em
tudo que estares a ler, até mesmo a verdade é uma coisa relativa.
Tu confias em tudo que eu escrevo? Se não, como confias em tudo que
o outro escreve! Há muitas mentiras disfarçadas de verdades, tenha
malícia nobre leitor, a verdade é um conceito que merece ser
contestado, seja para o bem ou para o mau. Se estás a ler somente um
livro há algo errado, ou contigo ou com o livro, pois este se afirma
enquanto relato que tem começo, meio e fim, e isso acontece
justamente para que nos debrucemos sobre outras obras, indo de
encontro a outros pontos de vista sobre o mundo que nos rodeia. A
função da obra de arte é libertá-lo de ideologias e paradigmas
sociais que o aprisionam, se o teu livro mais o aprisiona que o
liberta talvez seja melhor repensares o que estares a ler, a leitura
deve ser um passo para a libertação, não para a cegueira.
Liberte-se nobre leitor, liberte-se de ideologias que o aprisiona,
faz sofrer ou auto crucificar, vá de encontro com a luz, só a
leitura pode ser a luz que o fará ver.
Espero que nestas
poucas linhas algo tenhas aprendido, é preciso separar o bom do
ruim, assim como impor limites às ideologias que permitimos adentrar
nossas casas/vidas, ideologias são criadas pelo homem para
administrar a vida do homem, é preciso cautela, escolher entre a
cegueira ou a luz, de modo que esta segunda se revela em ideias
reveladas nos livros.
Estou-me a ir, vá
de encontro com a verdade, só “a verdade vos libertará",
vá...
Andréia Franco
20/05/2016.
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